domingo, 16 de julho de 2017

A Revolta da Chibata

  
" O mais polêmico e audacioso livro de Edmar Morel, dedicado ao marujo João Cândido, ganha de qualquer outro na bibliografia brasileira, tendo custado ao autor a cassação de seus direitos políticos. Morel pagou pelo crime de ter redimido dos insultos da historiografia dos donos do poder o magnífico marinheiro João Cândido"
Jorge Amado




   TITULO:  A Revolta da Chibata
   AUTOR: Edmar Morel
   EDITORA: Paz e Terra
   PAG.: 390

   Sobre o autor:
      Edmar Morel ( 1912 – 1989 ) – Pioneiro do jornalismo investigativo no Brasil, com reportagens de impacto sobre temas sociais e políticos. Trabalhou em grandes veículos de comunicação e na imprensa alternativa de esquerda entre 1930 e 1980. Publicou em 1959 ‘A revolta da Chibata’, após 10 anos de pesquisa. Entrevistou o próprio almirante Negro.


  Sobre a obra:
      Brasil, 1910, havíamos declarado abolição da escravidão em nosso país a apenas 22 anos. Uma jovem república, que ainda procurava se acertar.
      E a Marinha era uma dessas instituições. Apesar de se modernizar, ainda possuía um sistema de seleção do século anterior. Para piorar a situação, a marinha ainda mantinha o costume de aplicar os castigos corporais naqueles que desobedecessem as regras. E em uma sociedade que ainda guardava resquícios da escravidão, existia uma linha muito tênue entre a regra e a desobediência, principalmente quando os marinheiros eram em sua grande maioria pessoas negras e pobres, alistadas a força, nas ruas e nas cadeias.


    Dentro da instituição, existiam movimentos para abolir a chibata como ‘sistema disciplinar’, desde 1890. Mas nem uma delas se igualou a revolta de 1910.
   A ‘Revolta de Chibata’, como ficou conhecida, reuniu cerca de 2300 marujos.



   A revolta de 1910, no Rio de Janeiro, então Capital do Brasil, já estava sendo ‘cozida’ a algum tempo. Mas o estopim foi a pena de 250 chibatadas imposta ao marujo Marcelino Rodriguês, acusado de introduzir no encouraçado Minas Gerais duas garrafas de cachaça.

  “ Pensamos no dia 15 de Novembro. Aconteceu que caiu forte temporal sobre a parada militar e o desfile naval. A marujada ficou cansada e muitos rapazes tiveram permissão para ir a terra. Ficou combinado, então, que a revolta seria entre 24 e 25. Mas o castigo de 250 chibatadas no Marcelino Rodrigues precipitou tudo. O comitê Geral resolveu, por unanimidade, deflagrar o movimento no dia 22. O sinal seria a chamada da corneta das 22 horas. O Minas Gerais, por ser grande, tinha todos os toques repetidos na proa e na popa. Naquela noite o clarim não permitiria silêncio e sim combate. Cada um assumiu o seu posto e os oficiais de há muito já estavam presos em seus camarotes. Não houve afobação. Cada canhão ficou guarnecido por cinco marujos, com ordem de atirar para matar contra todo aquele que tentasse impedir o levante.
    Às 22h50min, quando cessou a luta no convés, mandei disparar um tiro de canhão, sinal combinado para chamar à fala os navios comprometidos. Quem primeiro respondeu foi o São Paulo, seguido do Bahia. O Deodoro, a princípio, ficou mudo. Ordenei que todos os holofotes iluminassem o Arsenal de Marinha, as praias e as fortalezas. Expedi um rádio para o Catete informando que a esquadra estava levantada para acabar com os castigos corporais.
  Os mortos, na luta, foram guardados numa improvisada câmara mortuária e, no outro dia, manhã cedo, enviei os cadáveres para terra. O resto foi rotina de um navio de guerra.”
  João Cândido
   

 

  Com os poderosos canhões da esquadra apontados para o Catete, então sede do governo, os revoltosos exigiam o fim dos castigos, melhoria da alimentação, melhores condições de trabalho e anistia aos revoltosos. O Governo se comprometeu a atender as revindicações e a conceder a anistia. Mas o fim da história não seria bem assim.
  Todos os líderes foram presos. Neste mesmo ano, uma denuncia de que a guarnição da ilha das cobras se amotinaria, fez com que a Marinha resolvesse agir antes. No dia 10 de Dezembro, pouco depois das 22 horas, os navios passaram a atirar contra o batalhão Naval e os canhões do exército martelavam a praça de guerra.
   A anistia concedida aos revoltosos da Chibata são canceladas e todos são mandados para a prisão. Alguns morrem devido aos maus tratos. Outros passam por um suplício maior.

  

  



“Senhor Deus dos desgraçados
  Dizei-me vós, senhor Deus,
  Se é verdade ou se é loucura
  Tanto horror perante os céus”
 Castro Alves






   66 marinheiros e mais 293 homens e 44 mulheres, tidos como ‘simpatizantes’ dos revoltosos, mas que não passavam de contras partidários. Foram metidos nos porões do navio cargueiro ‘Satélite’ e deportados para o Acre, para trabalharem na missão Rondom. Durante a viagem alguns seriam fuzilados, no que seria uma ‘tentativa’ de revolta.  Triste fim ainda aguardou aqueles que sobreviveram à viagem.

   Mas João Cândido resistiu apesar de tudo;

“O herói não renuncia nunca. Quanto mais sofre os golpes da adversidade, mais se sente com forças para reagir contra o destino implacável que o persegue.”
Silvio Moreira Lima.
     

  CONCLUSÃO
     Por muitos anos a história oficial do que ocorreu neste 1910 foi sendo recheada de inverdades. Relatórios da marinha foram emitidos com o intuito de retirar de João Cândido a liderança da revolta. Durante o estado Novo este foi um assunto proibido.
  Nos anos seguinte ao de 1946 começou-se a investigar a história. A primeira edição saiu em 1959, mas logo o golpe de 1964 acabou por diminuir as chances de uma discussão mais profunda. Somente com a abertura política isso foi possível
  Um verdadeiro legado de nossa história. Nossa história também possui sangue nas mãos e precisamos conhecer.

  

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